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Para empresários, governo quer usar IOF para fazer política monetária

No centro das discussões entre o governo e o Congresso, o aumento do IOF, um imposto usado pela União para fazer ajustes na economia, pode transformá-lo em um imposto simplesmente arrecadatório. A avaliação é de empresários e economistas que participaram da reunião do Comitê de Avaliação de Conjuntura da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), realizada na quinta-feira (29). A pedido da ACSP, os nomes dos participantes desta reunião não são divulgados. 

Estimativa da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) aponta que o custo do crédito, caso a medida seja aprovada, pode aumentar até 40% - o que deve afetar não só o consumidor, mas o pequeno e médio empresário, afirmou um representante do agronegócio. 

Em sua análise, a percepção é que, se o governo diz que vai arrecadar R$ 20 bilhões esse ano e R$ 40 bilhões no ano que vem, significa que vai continuar a gastar e, em consequência, aumentar o IOF. "É essa a mensagem que o governo passou: a hora que quiser mais dinheiro, é só aumentar alíquota. É um desastre, é assim que se desgoverna o país."

Para um empresário do varejo de material de construção, essa é uma espécie de 'confissão de culpa' por parte do próprio governo, de arrecadar mais porque precisa cobrir um furo na meta fiscal.

Um representante do mercado financeiro confirmou: as medidas tomadas mostram claramente que há um governo que, no campo econômico, tem um lado ideológico, deixando o ministro da Fazenda encarregado de resolver uma tarefa impossível. Por isso, a decisão de aumentar o IOF passa mais informações do que simplesmente impactos numéricos.

"Se for mantida do jeito que está, de risco sacado, de desconto duplicado dos recebíveis, o impacto no custo será de 10 pontos percentuais", afirmou. "Se a taxa média é em torno de 19%, segundo dados do Banco Central, o custo do IOF vai passar para 29% ao ano."

No conjunto das operações que seriam atingidas por essa majoração do IOF, continuou, o aumento seria de mais ou menos 25% do crédito total, um impacto em torno de cinco pontos percentuais. Isso também equivale, de acordo com o modelo do Banco Central, a um impacto na Selic de três pontos percentuais, como se a taxa tivesse passado de 14,75% para 17,75%.

No passado, o IOF era definido pelo Conselho Monetário Nacional, lembrou, mas passou a ser definido pelo Ministério da Fazenda. "O governo quer fazer política monetária usando o IOF, e isso é totalmente inadequado", afirmou. 

Por isso, os sinais de que esse aumento tem mais a ver com o aspecto arrecadatório do que qualquer coisa - uma mensagem ruim, em sua avaliação. "A campanha de 2026 já está aí, e com o governo querendo fazer ajustes do lado da despesa. Isso pode fazer os agentes econômicos ficarem receosos de virem outros possíveis aumentos." 

Sinais de desaceleração

Fazendo um paralelo com 'um motorista que pisa no freio e no acelerador ao mesmo tempo', o representante dos bancos destacou que, mesmo com a economia aquecida, que é um dos objetivos do governo, junto a uma taxa de juros em patamar elevadíssimo - o que não faz muito sentido -, a expectativa é assistir a uma diminuição da previsão de crescimento da economia, caso a medida vingue no Congresso.  

Na inflação, o impacto pode ser ambíguo, pois, diferentemente da Selic, o IOF pode simplesmente gerar um efeito negativo sobre o indicador. Por outro lado, alertou, as pequenas e médias empresas serão as mais atingidas pela alta.

"Temos uma esfinge à frente. O ministro da Fazenda procura um mínimo de racionalidade econômica, mas o governo pratica racionalidade política. Isso não casa com a situação atual do Brasil."

A opinião foi compartilhada por um economista presente à reunião: com esse impasse, do Ministério da Fazenda querendo segurar as pontas e o governo querendo gastar, a expectativa, segundo ele, é que o Congresso tome uma decisão mais aguerrida, e que o governo encontre outra saída para o problema das contas.

"Se o IOF passar, o que eu vejo pela frente, e o próprio Boletim Focus prevê, é a queda do crescimento ao longo do ano. Porque essa taxa do primeiro trimestre (1,4%) veio muito pelo setor agrícola (12,2%), e não vai ser possível repeti-la."

Perguntado se todo o volume de recursos injetados na economia, como a liberação do FGTS e o novo crédito consignado do trabalhador, já seria suficiente para impactar a política monetária, o representante dos bancos voltou a fazer a comparação de pisar no freio e no acelerador.

"Só vai fazer o carro rodar. Mas é a sanha do governo, totalmente política e eleitoreira, a praticamente um ano das eleições. O que se espera é se realmente vão conseguir manter, pelo menos esse ano, um PIB acima de 2,5%. A expectativa é que ele dê uma 'escorregada', mas o que nós sabemos é que em 2027 teremos um encontro com a verdade", afirmou. 

Ou seja, se agora o governo se vê quase 'obrigado' a tomar uma medida heterodoxa como a do IOF, o próximo governo assumirá em uma situação fiscal pior que a de hoje, e não vai escapar de enfrentar esse problema. "Aí, só tem duas maneiras: ou corta despesas, ou permite uma inflação. Porque esse nível de taxa de juros em que estamos hoje está insustentável."

Para outro economista, já existem sinais de desaceleração, apesar de não serem muito claros ainda, no geral. Estes devem se mostrar mais nítidos a partir do segundo semestre de 2025, já que o primeiro trimestre foi beneficiado pela expansão do agro e do consumo.

"Temos de ver como vai ficar o IOF, mas o aumento do custo de vida e a queda da massa de rendimentos já sinalizam o início de uma desaceleração", confirmou. "A única coisa que tem chamado atenção é a resiliência da atividade econômica e do mercado de trabalho, e isso continua no radar."

Setores se mobilizam

O representante do agro voltou a criticar o governo por já ter aumentado o IOF para operações com moeda estrangeira já que, segundo ele, "entrou bastante dinheiro do agro do exterior". Porém, em sua avaliação, o governo errou em mexer no imposto no atual momento, em que o setor enfrenta problemas ligados ao crédito.

Entre eles, a inadimplência e o aumento dos pedidos de recuperação judicial, puxados principalmente pela alta da taxa de juros, além dos problemas de insolvência em larga escala dos agricultores do Rio Grande do Sul, que ainda sofrem os efeitos das enchentes de 2024.

"Os produtores estão em pé de guerra com o Ministério da Agricultura, que acaba de prometer que conseguirá uma medida ampla, geral e irrestrita para securitização do crédito agrícola", sinalizou. 

Por isso, afirmou, mesmo que não esteja com as contas em dia, não é hora de o governo aumentar imposto em um setor tão estratégico, e não é à toa, disse, que a reação em Brasília tem impressionado. "Há muito tempo não vejo unanimidade em todas as confederações de todos os setores, e não só na agricultura e na indústria, mas no comércio, serviços, todos juntos e com a promessa de que vão derrubar o IOF. Se o governo não recuar, todos estão organizados para tomar uma medida rara no Brasil, que é derrubar por decreto legislativo se for preciso."

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IMAGEM: Freepik